Acorda instrumentista de corda

A execução de um instrumento musical exige do músico um esforço físico e mental que depende de vários fatores como o tipo de instrumento, a duração da execução, a dificuldade técnico-musical da obra executada, as condições psicológicas do executante durante a atividade e a resistência muscular individual de cada músico.

Com freqüência, os instrumentistas ficam sujeitos à situações que exigem de seu corpo um esforço físico maior do que o que ele está habituado. Situações como o aumento do tempo dedicado à prática do instrumento (gerado pela necessidade de se preparar para um teste de seleção, ou prova prática), o aumento súbito de atividade prática, o período de adaptação do músico à um novo instrumento, com diferentes características de montagem (um violino com cordas mais altas, que geram a necessidade de maior pressão dos dedos da mão esquerda sobre as mesmas), são exemplos corriqueiros de sobrecarga de trabalho do músico com seu instrumento.

Os instrumentos de cordas friccionadas, violino, viola, violoncelo e contrabaixo, possuem uma estrutura que favorece o excesso de tensão durante sua execução, principalmente no caso de violinistas e violistas. Enquanto o violoncelo e o contrabaixo são apoiados no chão, o violino e a viola são apoiados sobre o ombro esquerdo do executante, que deve também repousar a cabeça sobre o instrumento apoiando-a através do ramo esquerdo da mandíbula. Além disto, na execução desses instrumentos, os membros superiores trabalham de forma assimétrica: o membro superior esquerdo, mais estático que o direito, atua sobre o braço do instrumento (articulação dos dedos sobre as cordas) enquanto o membro superior direito aciona o arco, com movimentos muito mais amplos que o esquerdo, mas com menor movimentação dos dedos.

Podemos observar que, tanto no ambiente acadêmico (escolas, festivais), quanto no ambiente profissional (orquestras, grupos instrumentais diversos, solistas profissionais), os problemas físicos gerados pela tensão muscular excessiva são muito freqüentes, e dificultam ou impedem o instrumentista de realizar sua atividade.

No entanto, apesar dos esforços, muitos problemas acontecem mesmo entre grandes instrumentistas. Em 1995 o violinista do Quarteto Tokyo, Peter Oundjian, esteve afastado de suas atividades musicais, recuperando-se de uma alteração de sensibilidade no dedo mínimo da mão esquerda. Em Abril de 1996, o violinista russo Maxim Vengerov cancelou seus compromissos artísticos por seis semanas, para tratamento de um estado de exaustão. No mês de março deste mesmo ano, o violoncelista Yo-Yo-Ma cancelou sua turnê pela Europa, surpreendido por uma tendinite.

Possíveis causas do stress físico em instrumentistas de cordas

Nos anos 70 surgiu em países do Primeiro Mundo a especialidade médica hoje chamada de Medicina Esportiva e nos anos 80, surgiu a Medicina Musical. Com o crescente interesse pelo assunto, vêm sendo publicados muitos livros e artigos sobre o assunto, inclusive a revista trimestral especializada Medical Problems of Performing Artists.

As atividades dos músicos e atletas mostram, na verdade, vários aspectos em comum. Ambas envolvem um treinamento muscular, que inclui longas horas diárias de prática visando, em geral, uma apresentação pública onde o músico ou o atleta deverá demonstrar habilidade e eficiência. Entretanto, o atleta possui uma vantagem sobre o músico, já que tem um treinador e um médico, responsáveis por sua saúde, trabalhando com ele diariamente. Tal fato não ocorre no caso do músico.

Alguns instrumentistas continuam sua atividade mesmo quando têm problemas musculares, muitas vezes estimulados pelos próprios professores. Essa situação é conseqüência da desinformação sobre os processos físicos que podem trazer problemas para o corpo.

Ainda são poucos os estudos feitos sobre o assunto. Vários fatores são apontados como causa dos problemas físicos nos instrumentistas de cordas. Podemos separá-los em três grupos: sobrecarga muscular, problemas de natureza psicológica e situações que contribuem para o agravamento do stress físico.

O primeiro destes três grupos foi exaustivamente estudado por Dr. Hunter J. H. Fry, cirurgião plástico de Melbourne, Austrália. Até 1986, sua pesquisa envolveu nove escolas de música e seis orquestras sinfônicas da região, com exames realizados em 379 músicos. Deste número, 181 (47,8 %) eram instrumentistas de cordas. Dr. Fry constatou que violinistas e violistas foram os músicos mais afetados pela sobrecarga muscular.

O segundo envolve a chamada ansiedade de desempenho e seus efeitos nos componentes físicos da execução instrumental. Um outro termo utilizado para descrever esta situação é "medo de palco", e que é o tema central do livro Stage Fright da violinista húngara Kato Havas.

O último grupo, denominado "situações que contribuem para o agravamento de stress físico", abrange aquelas situações que favorecem uma sobrecarga de trabalho ou uma inadequada utilização do instrumento pelo músico. São situações muito diversificadas que variam desde a aquisição de um novo instrumento, que exige adaptação física (por exemplo no caso de um novo violino, cordas mais altas do espelho, queixeira mais alta ou mais baixa, arco mais pesado, braço do instrumento mais largo), até a proximidade de um exame final de bacharelado em música, que força o estudante a aumentar muito seu tempo e empenho no estudo do instrumento.

As conseqüências do stress físico são sérias e podem dificultar ou impedir a atividade do instrumentista de cordas. Se você é músico, procure sempre o acompanhamento de profissionais especializados na sua saúde. Eles poderão orientá-lo e tratar os problemas de uma maneira correta e eficaz.